Intertextualidade nas vozes de Camões e de Renato Russo

Entre o discurso de Renato Russo e de Camões manifestam-se traços de intertextualidade
Entre o discurso de Renato Russo e de Camões manifestam-se traços de intertextualidade

Antes de iniciarmos essa calorosa discussão acerca das relações que se estabelecem entre essas vozes - ímpares por sinal-, tomemos, primeiramente, os exemplos a seguir, haja vista que eles alicerçam os posicionamentos que se fazem relevantes nesse nosso encontro. Ei-los, portanto, demarcados pelo poema de Luís Vaz de Camões, “Amor é fogo que arde sem se ver”, e pela música “Monte Castelo”, do grupo Legião Urbana:

Monte Castelo

Ainda que eu falasse
A língua dos homens
E falasse a língua dos anjos,
Sem amor eu nada seria.

É só o amor! É só o amor
Que conhece o que é verdade.
O amor é bom, não quer o mal,
Não sente inveja ou se envaidece.

O amor é o fogo que arde sem se ver;
É ferida que dói e não se sente;
É um contentamento descontente;
É dor que desatina sem doer.

Ainda que eu falasse
A língua dos homens
E falasse a língua dos anjos
Sem amor eu nada seria.

É um não querer mais que bem querer;
É solitário andar por entre a gente;
É um não contentar-se de contente;
É cuidar que se ganha em se perder.

É um estar-se preso por vontade;
É servir a quem vence o vencedor;
É um ter com quem nos mata a lealdade.

Tão contrário a si é o mesmo amor.

Estou acordado e todos dormem.
Todos dormem. Todos dormem.
Agora vejo em parte,
Mas então veremos face a face.

É só o amor! É só o amor
Que conhece o que é verdade.

Ainda que eu falasse
A língua dos homens
E falasse a língua dos anjos,
?
Sem amor eu nada seria.

Legião Urbana

Amor é fogo que arde sem se ver

Amor é fogo que arde sem se ver;
É ferida que dói e não se sente;
É um contentamento descontente;
É dor que desatina sem doer.

É um não querer mais que bem querer;
É um andar solitário entre a gente;
É nunca contentar-se de contente;
É um cuidar que se ganha em se perder.

É querer estar preso por vontade
É servir a quem vence o vencedor,
É ter com quem nos mata lealdade.


Mas como causar pode seu favor
Nos corações humanos
amizade;
Se tão contrário a si é o mesmo amor?

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Camões

Podemos perceber que a ideia global – demarcada pela exaltação do amor – prevalece em ambas as criações. Partindo então dessa prerrogativa, vemos através das demarcações realizadas de cores distintas, porém correlacionadas entre si, que algumas vezes a intertextualidade se dá de forma explícita, ou seja, de forma idêntica, como revelado na parte preenchida pela cor amarela.

Prosseguindo com nossa análise, sobretudo fazendo menção agora à cor demarcada pelo laranja, notamos que Renato Russo, na época ainda vocalista do grupo Legião Urbana, fez uma releitura, ampliando as ideias retratadas pelo poeta Camões mediante a criação de palavras novas. Dessa forma, não há como negar que esse entrecruzar de ideias se delineia como uma espécie de complementação, ou seja, um recorte que se faz dos muitos diálogos com os quais estabelece familiaridade.

Cabe-nos, portanto, reforçar a ideia de que as relações intertextuais somente se tornam cada vez mais explícitas à medida que o interlocutor amplia sua bagagem cultural, por meio de leituras diversas, pois somente assim essa conexão que há entre as vozes de um dado discurso se torna desvendada. Por essa razão cabe ainda frisar que um leitor desatento, digamos assim, não muito bem preparado, não estaria apto para realizar as intenções que se atribuíram ao discurso de Renato Russo, bem como de outros emissores que porventura pudesse se deparar, haja vista que a leitura, concebida sob essas condições, manifesta-se como superficial, insuficiente.

Aproveite para conferir a nossa videoaula relacionada ao assunto:

Por: Vânia Maria do Nascimento Duarte

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